terça-feira, outubro 19

O Último Título


Línguas cortantes, cabeças surtadas, relâmpagos de trovoadas. E eu aqui sentada, decifrando pronomes, adjetivos da tua fala. Torturante eram os dentes que se batiam dentro de uma boca silenciosa. Falhas aconteciam, os pesadelos eram torturantes, mas no final tu eras o clarão dos sonhos. Nos óculos marcados nas lentes, os belos versos escritos, nas razões para códigos, que continuam apunhalados entre nós.

No inicio eram pregos que torturavam e enrolavam-se. Tudo estava errado e permanente. Versos escorriam da tua boca, como se fossem cascatas de chocolate com cerejas, aquilo era tão maior que eu; apenas observava quieta.

Sentia um mistério no ar. Minha respiração agonizava, de tão sufocantes que eram seus olhares, tu distraída entre dramas e lágrima, comédia e sorrisos. Pensava em te guiar, mas não conseguia falar, isso tudo me assustava. Como uvas silvestres caindo da parreira. Como pingos de chuvas torturantes sobre a nossa cabeça.

O telefone tocava, eu recebia notas fiscais, tinha que comprar mais doces e incenso. O despertador gritava, e eu apenas queria que chovesse mais um pouco sobre a janela. Tinha que ir ao teatro, na doce primavera que nos acolhia, formando um anzol de flores, rosas, girassóis. Eu precisava sentir isso outra vez. E eu sabia que já não era mais um crime.

Será que chegou a hora de entregar meu coração mais uma vez? De sentir teus leves cabelos batendo em meus ombros. Ou quem sabe tu se tornar meu amor platônico? Do tipo amante intelectual, que faz vibrar na sua essência da escrita.

E repito, quantas vezes quiser como é bom o sabor do mistério. Aquele gosto de fruta roubada, da água gelada, do sorvete que eu quero provar.

Mas sem poder sentir.

Como o lençol usado, o grito de esperança, o calor da tua escrita, o fogo das palavras, meus olhos verdes atenciosos a qualquer preposição, verbo, artigo. Eu me entrego aos teus braços, em forma de música, versos em brancos, a espera de um novo título.

Um comentário:

  1. Mistério seria a definição exata, eu creio, porque frases cortadas, moldadas, enfeitadas e aflitas montam versos únicos, os melhores. Não se ter certeza do que se sente ao ler é instigante, perturbador. Como cair de para-quedas em um mundo paralelo e não sentir a perdição, pelo contrário, a familiaridade.

    Gostei..

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