quarta-feira, outubro 20

Volte para casa!


Eu nunca prestei atenção em coisas indecifráveis, até tu aparecer.

Preparar o café, comprar o pão, juntar a sujeira, bater com o travesseiro, te acolher em meus braços, dividir o mesmo cigarro, sorrisos, lagrimas por paixão, fazendo contas matemáticas enquanto tu escolhias a tal música para me mostrar, de lugares para casa, da casa para os beijos. Era o mesmo percurso de todos os dias.

Lembro-me do nosso sexo na janela, com uma xícara de café que caiu do oitavo andar esparramado em gargalhadas, com canções e palavras que só eu posso descrever, olhando para o céu, enquanto me beijava o pescoço. Sentiria como se fosse algo impossível, inacreditável, surpreendente, simplesmente único. Mas que teria seus consequentes. Era o mesmo percurso de todos os dias. E eu te adorava por isso.

Nos momentos que eu sentava na pia do banheiro, e tu me sujava de maquiagem. E sempre repetia a mesma frase: - Tu és tão linda, mesmo parecendo uma louca. E eu respondia apenas com um sorriso de mulher instigante. Eu sabia que quando eu saísse do banho, tu estarias me esperando, com um livro na mão, e prontamente a me envolver em teus braços. Era o mesmo percurso de todos os dias. E eu gostava.

Eu nunca saberia que dormiria assim nos braços de outro, que me sentiria tão abrigada e ao mesmo tempo tão apreciada. Confortada, seria a palavra certa. Mas na verdade sempre soube que um dia isso iria acabar, pois nossos corações eram errantes, sim combinavam, mas não poderíamos dividi-los com o mundo. Primeiro eu desapareci, por pensar que seria melhor.

Mas foi diferente. Acabei te jogando para fora da minha vida, para fora do meu mundo, para fora dos meus livros. E me arrependi. Mas foi melhor, por que vi em teus olhos, que tu precisavas ir, e que eu precisava ficar.

E sei que tu voltarás, e talvez eu não esteja em casa. E sei que eu não vou estar.

Até o próximo verão, talvez nem eu seja mais a mesma. Tento me encontrar em afagos de desconhecidos, mas no mesmo instante cai a face ao chão, cada suspiro, a vista da lua, a paciência das histórias, o jogo do alucinar e alucinando me fazia feliz, em pequenas quantidades. Isso bastava. Nos percursos dos meus dias.

Andando de esquina a meia quadra, a ouvir o ronco dos tropeços, encolhidos por serem de quem não são. E onde tu estarás? Destes bares, qual irei te encontrar?

Comparsas de crime, insanidade carnal, fogo de metáforas escondidas por de baixo da escada. Saiba que nunca ira ser substituído, e que ainda tens o teu cheiro, o teu marco em meu corpo, na minha alma, na minha essência. Tu ainda fazes parte da minha história contada.

Algumas pessoas na rua, e eu voltando para casa.

Era uma sensação tão estranha, o mesmo discurso, como se eu estivesse completamente sozinha. O vento batia nos meus cabelos, o meu olhar era extenso. Era o mesmo percurso de todos os dias. Os dias que passam. Eu sinto teu cheiro. Olhando para traz, imaginando que qualquer pessoa com o mesmo perfume seja você. Era o mesmo percurso de todos os dias.

2 comentários:

  1. O novo relacionamento da personagem despertou nela a sensibilidade para admirar as "coisas indecifráveis", como ela mesma intitula ações ordinárias do dia-a-dia.
    Aspectos amorosos da relação são intercalados com praxes mundanas, para a personagem a ligação entre os dois era tão natural como qualquer outra atividade, tais atividades, na presença dele, tornavam-se extremamente palatavéis.
    A sentença "era o mesmo percurso de todos os dias" surgi no texto como ligação entre os bons momentos de convivência do casal, verifica-se isso em três momentos:

    No segundo parágrafo: "(...) bater com o travesseiro, te acolher em meus braços (...) de lugares para casa, da casa para os beijos. Era o mesmo percurso de todos os dias.";

    No quarto parágrafo: "(...) sempre repetia a mesma frase: - Tu és tão linda, mesmo parecendo uma louca. (...) Era o mesmo percurso de todos os dias. E eu gostava.";

    No último parágrafo surgi duas vezes: "(...) o meu olhar era extenso. Era o mesmo percurso de todos os dias. (...) imaginando que qualquer pessoa com o mesmo perfume seja você. Era o mesmo percurso de todos os dias."

    Assim a frase acima abordada serve como elo de ligação entre os momentos de afeto dos amantes
    A sentença é sempre precedida por recordações agradáveis, exceto na frase "olhar extenso", nesse se manifesta a saudade que a personagem sente do amado, esse sentimento é explorado até o fim do texto, sendo maximizado com a sentença de ligação discorrida.

    Essa é a minha análise técnica do seu texto. O recurso que eu citei, as sentenças de ligação, é uma técnica bastante usada mesmo fora da literatura, textos dissertativos-argumentativos apelam com frequência à essa técnica.
    Enquanto ao enredo, explicitamente romântico (denotação não histórica), pude perceber que ele carrega muitos elementos partilhados com outros textos do gênero: afeto; amor; resignação e saudade. Nessa ordem.

    Há uma falta fonológica: ira (antepenúltimo parágrafo);
    Há um erro de sintaxe: (...) seus consequentes (...) (final do terceiro parágrafo).

    Continue escrevendo, és boa nesse estilo.

    ResponderExcluir
  2. Fico lisonjeada em ter uma "análise técnica" do meu texto. As faltas e erros são apenas minha licença poetica. rsrs
    Obrigada

    ResponderExcluir